Talvez estejamos vivendo a maior pandemia de muitas décadas. Os resultados são incertos, o que restará ainda não pode ser contabilizado, mas os profissionais da logística precisam estar preparados e serem protagonistas dessa história. Ajudando na solução dos problemas complexos que a realidade dura nos imporá.

Sabe aquela expressão “Pare o mundo que eu quero descer”? Pois é, o mundo “parou” e agora descobrimos que não podemos descer. Essa realidade, imposta, nos faz refletir que em momentos como esse que estamos enfrentando, uma luta contra um vírus que tem mudado a rotina do mundo, precisamos nos reinventar. Fugir não é uma escolha. Quando houve a greve dos caminhoneiros, fiz uma reflexão sobre as lições aprendidas para os logísticos e, agora entendo que, também podemos refletir um pouco sobre o momento atual. 
Partamos do princípio de que diante a essa pandemia é necessário que nós, profissionais da logística, levemos em consideração alguns aspectos que são determinantes para colaborarmos com toda sociedade uma vez que não temos, como diz o título do artigo, como “descer do mundo”.

As cadeias logísticas são globais, impactou lá, fatalmente atingirá aqui

Mesmo supondo que os leitores tenham um alto nível de saber sobre, permitam-me falar um pouco conceitualmente sobre cadeias produtivas globais. Os logísticos, por definição, sabem que toda essa globalização trouxe consigo a necessidade de gerenciar de maneira eficiente as cadeias de suprimentos. Por vários motivos, entre eles está a garantia do pleno abastecimento de toda cadeia produtiva local e mundial, o possibilidade de que as conexões entre os elos econômicos e sociais possam se concretizar trazendo para toda sociedade, agilidade, segurança e conforto diante de todas as demandas. Enfim, são quase infinitos os motivos pelos quais uma boa gestão da cadeia de suprimentos é necessária. Por estarmos tratando de cadeias de suprimento globais, que podemos definir como uma rede interligada de negócios, que abrange desde o armazenamento da matéria-prima até o produto final no ponto de consumo. Fatalmente em crises como a que estamos vivendo, tão certo como o vírus se espalhou serão as consequências e estragos por onde ele passar. Por isso, assim como os órgãos de saúde estão tomando ações baseadas nas lições aprendidas com os outros países que estão passando ou já passaram pelo surto, nós da logística precisamos entender os impactos gerados pelo surto e nos anteciparmos com ações. A ideia é continuar impedindo desabastecimentos de matéria prima de fábricas, de alimentos para os mercados, medicamentos, toda sorte produtos para consumidores. No entanto, para isso, um profundo conhecimento dos impactos é necessário. Ter detalhado como funcionam os vários canais de vendas, os fluxos de materiais, as regras governamentais em todos os âmbitos, principalmente nesse momento de várias exceções. Mas o mais importante e desafiador é entender como será o comportamento do consumidor que, por vezes, reagirá a estímulos diferentes aos habituais. Então abramos nossos olhos para os impactos nos demais países para aprendermos com eles.

Nossas decisões e escolhas costumam determinar nosso futuro

O que fizermos agora vai nortear os resultados no futuro. Não podemos ficar na condição, como diz a música, “…deixa a vida me levar, vida leva eu…”. É imprescindível que não caíamos no erro da omissão. Por definição, omissão é deixar de fazer ou dizer alguma coisa. Também pode ser entendido como deixar de lado, desprezar ou esquecer algo ou alguém. Dessa forma, deixar de tomar decisões, de fazer os levantamentos necessários e estudos de impactos ou mesmo ignorar os efeitos de uma crise e ainda não assumir o caráter de responsabilidade social que temos, não pode ser uma escolha nossa. Longe disso, nós profissionais de logística temos toda a capacidade em todos os níveis que trabalhamos, mas principalmente no estratégico, de agirmos de maneira a promover e disseminar ações que garantam um futuro promissor. Por isso, o bom preparo dos profissionais para entender o que está acontecendo, a busca de informações confiáveis, a capacidade de análise de dados, um fluxo de troca de informações dinâmico, e a utilização de técnicas estatísticas, são fundamentais para as boas decisões. Teremos momentos em que o ideal será copiarmos o que nossos parceiros e até mesmo concorrentes estão fazendo, mas uma boa decisão baseada nos estudos que tragam uma solução única e inovadora em meio à crise poderá lhe fazer líder em seu negócio. Entender o que seu cliente vai precisar e quais os impactos terá pode ajudar a se preparar para atendê-lo, além do que já estava contratado. Poderá ainda lhe ajudar a superar esse momento de dificuldade econômica, mantendo seus bons resultados e, após a tempestade, quem sabe não ocupar um lugar até melhor que o de antes. Pensem nisso: as decisões acertadas, bem estudadas, podem nos colocar em patamares superiores no futuro. Momentos de crise também servem para isso.
Clientes satisfeitos com nossas ações contingenciais, provavelmente, confiarão  ao nos entregar mais negócios em momentos de bonança. Acredite! 

Atenção, quanto menos ações de prevenção mais prejuízos teremos

Prevenir é dispor as coisas buscando evitar um mal, um dano, impedir que se execute ou que aconteça; informar com antecedência; exercer influência favorável ou contrária e por aí vai… Lembre-se daquela expressão, “é melhor prevenir do que remediar”. Diante disso, acredito que fique claro que é mais do que uma sugestão, é uma necessidade que profissionais da logística trabalhem com esse importante item que é a verdade por trás da prevenção. Tudo que pudermos identificar e avaliar, entender que posturas preventivas precisam ser tomadas, não podem ser negligenciadas, pois, são essas ações que podem definir o prejuízo ou sucesso de sua empresa ou negócio.
Tenha em mente que ao visualizar, de forma realista, o cenário a sua frente, lhe possibilitará adquirir as ferramentas corretas, para eliminar ou mitigar os danos que surgirão. Isso é fundamental! Tentar evitar que aconteça um dano maior é possível. É claro que, nem sempre, poderá evitar um desabastecimento de estoque, porém, se estiver preparado para isso, poderá dirimir os prejuízos. Lembre-se de que as cadeias são interligadas e possivelmente seus clientes irão passar por problemas como esse com outros fornecedores. O fato de você ter previsto o problema, se prevenido, poderá ser o diferencial. Tenha em mente que um dos itens mais importantes nas cadeias de suprimentos é o fluxo de informação, e quando ele está alinhado suas chances de sucesso, e por consequência a satisfação de seus clientes, serão bem maiores.

Os recursos são esses, temos que saber utilizá-los

Um dos sucessos da logística é saber trabalhar de maneira racional e sem desperdícios. É baseado nesse ideal que aparecem conceitos como, por exemplo, a “Logística Enxuta”, também conhecida como “logística lean”, que é a atividade logística baseada no modelo de gestão “sistema lean”, filosofia de gestão embrionária do modelo Toyota, que, em essência, visa identificar, em qualquer processo produtivo, as atividades que agregam valor aos clientes (o que eles estão realmente dispostos a pagar) e eliminar os desperdícios (o que eles não estão dispostos a pagar).
Dito isso então, para nós logísticos, não é nenhuma novidade o fato de trabalharmos de maneira enxuta, seguindo a definição citada acima. Em momentos como o que estamos vivendo, não há uma definição exata do que se demandará de recursos. A falta de matéria prima, por exemplo, ainda pode vir a acontecer, por isso, cálculos precisam ser feitos, acompanhamentos de níveis de estoque, dead line de pedidos, comportamento da malha viária, seja rodoviária, ferroviária, aeroviárias, etc. Esses cuidados devem estar no “Top 3” das prioridades do logístico. Afinal, baseando-se nessa realidade é que saberemos quais medidas de contenção terão que ser tomadas com intuito de evitar ou postergar possíveis rupturas.
Diante disso, temos que ter bastante consciência dos recursos que serão demandados, como os faremos chegar até quem os demandou e fazer tudo isso de maneira extremamente racional.

Aos que, às vezes, pedem para o mundo parar porque querem descer, de fato o mundo “parou”. Agora, descer não é uma opção

Não temos escolha, talvez essa seja a riqueza da profissão. Mesmo que tudo aparentemente esteja estagnado, engasgalhado e que, de fato, as pessoas tenham a impressão de que o mundo parou, nós temos que estar em alerta e oferecer para as empresas, governos, clientes e a sociedade como um todo, soluções que garantam mobilidade, transporte adequado de materiais, estoques em níveis aceitáveis. Planejamento, visão direcionada, focada, treinada a avaliar caminhos críticos, identificação de potenciais riscos e a forma de administrá-los, garantirá que se, mesmo que temporariamente, o mundo “parar”, possamos garantir que as pessoas tenham em suas casas o ideal para seu bem-estar e sobrevivência. Acredito que tudo que está acontecendo, nos mostra que “descer do mundo” não é uma opção.
Tenho recebido postagens sobre o caso dos músicos do Titanic que pereceram durante o naufrágio do navio em 1912. Eles tocaram, pretendendo acalmar os passageiros, por todo o tempo que foi possível.  A ideia aqui não é ser dramático, pelo contrário, é valorizar o trabalho de alguns profissionais como os médicos, enfermeiros, socorristas e até mesmo os profissionais da logística. Enquanto for necessário, temos que estar de prontidão para agir, colocar em prática tudo que aprendemos ao longo de nossa carreira em prol da sociedade.

Considerações finais 

Por fim, o momento pede atenção. Mesmo que pareça que o mundo está “parando”, não tente “descer”.  A sociedade precisa de nós. Precisamos ter cuidado nas tomadas de decisão, pois elas traduzirão nosso futuro. Temos que estar prevenidos, atentos e preparados. Aguardar as demandas que serão impostas. Tendo em mente que racionar os recursos, usar de maneira adequada, enxuta, é fundamental. Parado ou não, o mundo precisa de nós.


Charles Dias da Cunha é tecnólogo em Logística Empresarial, com MBAs em Gestão de Projetos e em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Bacharelando em Teologia pelo Seminário Teológico Koinonia. Possui mais de 20 anos de experiência em transporte rodoviário de carga, atuando em operações inbound/outbound, distribuição, carga fracionada, gestão de frota, contratação de transportadoras, atendendo empresas da indústria automobilística, varejo, farmacêutica, química, agronegócio, mineração, siderurgia, entre outras.

Fonte: https://revistamundologistica.com.br